A nuvem da crise paira sobre toda a Europa. Alguns países, porém, estão sofrendo menos com as consequências dos problemas econômicos que chegaram ao continente. Embora a força da economia alemã tenha garantido sua posição dominante dentro do bloco – e como base dos países que precisam de auxílio para passar pela crise -, seu importante papel pode significar grandes riscos para as demais nações. Uma crise da gigante germânica poderia gerar um efeito dominó e, finalmente, uma recessão continental.
Professor de Relações Internacionais da Universidade Estadual de São Paulo (USP) e natural de Berlim, Kai Lehmann afirma que um dos motivos que levou a Alemanha ao topo da economia europeia foi o investimento do governo em qualificação de profissionais. “Existem trabalhadores de altíssimo nível. A produtividade por horas trabalhadas na 2631897-2363-recAlemanha é altíssima também e isso tem reflexo na competitividade da economia como um todo”, explica. Já o professor de Relações Internacionais da ESPM-SP Leonardo Trevisan lembra ainda que depois da sua reunificação, em 1990, o país ganhou densidade com os trabalhadores que antes estavam apenas na parte ocidental.
Outro motivo destacado para a força da Alemanha são os ajustes econômicos feitos por seu governo. Trevisan observa que enquanto muitos países europeus estudavam tomar medidas para melhorar suas economias, o país germânico já as colocava em prática. “A Alemanha fez uma série de reformas para tornar o produto exportado mais barato, como segurar os salários”, afirma. Além disso, foram diminuídos o número de funcionários no governo, controlando o tamanho do estado alemão que, segundo o especialista da ESPM, hoje é em torno de 20 a 25% menor que o estado da Grécia.
As medidas deram maior destaque às exportações das quais dependem o país. A pauta diversificada fez com que a Alemanha ficasse próxima à China no posto de maiores exportadores do mundo. A gigante asiática também é uma grande compradora dos produtos alemães. “A China compra 60% dos produtos de média e alta tecnologia da Alemanha. Máquinas sofisticadas, como turbinas de aviões, por exemplo”, afirma Trevisan. A grande capacidade de vender produtos altamente tecnológicos para o exterior é resultado da elevada produtividade. “Com 88 milhões de pessoas, ela exporta cinco vezes mais do que o Brasil”, observa o professor da ESPM. Ele ressalta ainda que a produtividade por horas de trabalho de um alemão é 30% maior do que a de um francês, por exemplo.
Por apresentar tanta força econômica dentro do bloco, as consequências caso uma grave crise abatasse o país seriam bastante significantes. E a Alemanha já vem sofrendo com os problemas financeiros que atingiram seus parceiros, pois muitas de suas exportações eram destinadas a países europeus. Trevisan lembra que 40% das importações da Espanha vinham da Alemanha e que, com a crise, o país ibérico passou a comprar menos. Ele observa, ainda, que o crescimento do país desacelerou nos últimos dois trimestres.
Lehmann acredita que se esses problemas alemães se agravarem, a Europa poderia entrar em colapso. “Não teria quem entrasse no lugar para sustentar o mercado europeu. O seu bem-estar depende do desempenho da Alemanha e da França. Se a Alemanha tivesse uma crise financeira como a Espanha ou a Itália, não existirima recursos para resgatar sua economia”. Para Trevisan, o Banco Central Europeu não poderia arcar com a promessa de ajuda às demais nações, já que o dinheiro pertence ao governo alemão
A moeda única da Europa também estaria a perigo
O euro, implementado em 2002, também depende da economia alemã. Lehmann acredita que caso a Alemanha ou a França, outra grande economia europeia, decidissem se retirar da Zona do Euro, a moeda não sobreviveria. “É uma criação franco-alemã. Politicamente, os dois governos foram os que mais incetivaram a sua criação, e os dois têm muito peso político até hoje. Se eles se retirassem, declarariam uma falta de confiança no próprio projeto”, afirma. O especialista ainda complementa que se a Alemanha recriasse sua moeda nacional, o deutsche mark, o restante da Europa teria que reorientar sua política monetária.
Para o diretor da Câmara Brasil-Alemanha de São Paulo e coordenador do Comitê de Relações Institucionais e Governamentais, Ingo Plöger, a desaceleração no crescimento da Alemanha irá proporcionar políticas que o estimulem novamente. Quanto à saída do país da Zona do Euro, Plöger parece pouco crédulo. “Essa hipótese é muito improvável. Ela seria a última a sair do euro”, afirma. A moeda única traz grandes vantagens às exportações do país, setor fundamental da sua economia.