A economia que independe do resultado das eleições

“É melhor rever seus orçamentos para 2023 para não ser pessimista demais”

Ingo Plöger – Empresário, conselheiro presidente do Conselho Empresarial da América Latina – CEAL.

Os britânicos costumam dizer que se quisermos saber o estado de sua saúde, não devemos perguntar ao coveiro. Seguindo esta máxima da sabedoria popular, é melhor não perguntar ao setor financeiro sobre a situação econômica do Brasil em 2023. As respostas serão muito similares, partindo de um cenário bastante preocupante no campo internacional, seguido da inflação internacional e da insegurança que só aumenta a cada dia. Partindo destas premissas nada boas, vem os números que assustam: crescimento do PIB = 0; inflação ao final de 2023 = 6%; desemprego = 10 milhões de pessoas; Selic = 11%; endividamento público acima de 90%; RS$/ US$ = 5,5%; IED = US$ 50 bilhões.

Mas, então, olhamos para as projeções para este ano realizadas no final do ano passado: crescimento zero ou negativo, inflação em dois dígitos, desemprego em dois dígitos e endividamento crescente e constatamos que elas estavam erradas, o que eu já previa. Minha aposta ao final de 2021 era de crescimento acima de 2% e se devidas medidas de abertura de mercado fossem feitas e houvesse redução de impostos, a inflação seria decrescente.

Dificilmente pode se antever crescimento zero e uma Selic de dois dígitos, pois o BC vai manter política estável

Será que as previsões para 2023 vão errar novamente? A lógica do erro foi ter se baseado em cenários negativos e no acirramento das incertezas eleitorais que poderiam levar investidores a saírem do Brasil e deixar a Bolsa de Valores em franca queda. Mas não é isso que está acontecendo. E a pergunta é, será que as previsões para 2023 errarão novamente pelas mesmas premissas equivocadas?

Primeiramente, quem mais cresceu em 2022, foi o agronegócio, seguido das commodities e da área de serviços. A indústria foi a que menos cresceu – menos por conta da demanda, mais pela disrupção das cadeias produtivas globais, que deixaram de entregar componentes para finalizar os produtos. A inflação de oferta fez com que os preços de produtos industrializados se descolassem da base de referência, alcançando novos patamares e puxando outros produtos no ciclo dos usados para cima. A construção civil, ainda com estoques, embora com preços bem acima dos lançamentos, manteve o ritmo e está buscando adequar sem atropelos os reajustes nos contratos de longo prazo.

Já no emprego, vimos acontecer algo inesperado em relação às contratações na carteira, entre 230-250.000 empregos por mês consecutivamente, sendo o setor de serviços o que mais contratou, seguido da indústria e depois do agronegócio. No campo dos gastos públicos, as normativas de exceção pelo gasto com o Auxílio Brasil, precatórios e Fundo Eleitoral furaram o teto de gastos, mas não causaram desastres porque a arrecadação subiu tanto no federal, quanto no estadual e no municipal entre 10-15%. O superávit primário se mostrou robusto, não significando risco estrutural. Portanto, ao final de 2022, provavelmente teremos: PIB= 2,4%; Inflação = 7%; Desemprego = 8 milhões; Selic 12%; IED acima de 65 bilhões e superávit comercial = US$ 45 bi U$; RS$/US$ = 5,3%.

Seguindo a base inicial de 2023, teremos, sim, um cenário externo mais incerto, volátil e de valorização do US$ pela alta de juros nos EUA, e na Europa pela recessão em curso. Mas, pelo lado positivo, a demanda do agronegócio continuará firme, ainda que com preços mais competitivos. O superávit comercial poderá estar superior a 50 bilhões pela demanda por produtos brasileiros que embutem energia sustentável, necessidade alimentar e de ração. As entradas líquidas de investimentos diretos IED serão maiores que em 2022 pelos ativos brasileiros que ainda estão com valores aquém de seu potencial, esperando-se um valor superior a US$75 bilhões.

O PIB industrial aumentará pelo fato de se equalizar até o final do ano de 2023 a questão da maioria dos componentes para bens industriais, findando o backlog atual na indústria. A questão dos serviços será interessante, pois teremos de um lado uma queda pelos juros ainda elevados, que inibirá atividades de consumo, mas por outro lado a perspectiva de queda de juros manterá a construção civil andando em compasso menor, mas não estagnada.

A expectativa de termos no final do ano que vem juros interbancários de 2 dígitos é pouco provável (embora o setor financeiro torça por isto). O fato novo é a independência do Banco Central, não mais sendo usado para debelar a inflação, valorizando a moeda acima de seu equilíbrio, e a vontade expressa de maior competição entre os agentes.

Um observador atento percebe que a direção do Banco Central tem reduzido os juros em velocidade maior que seus antecessores o fizeram. Portanto, podemos esperar taxa Selic de 1 dígito a partir do segundo ou terceiro trimestre. Esta sinalização incrementará investimentos de médio e longo prazo. Os investimentos pelas contratações realizadas para os próximos anos em infraestrutura, no mínimo, refletirão algo em torno de R$ 60 -70 bilhões anuais, sem falar de investimentos em energia e transmissão pela privatização da Eletrobras. Seguindo esta lógica, a empregabilidade que talvez não empregue tanto em serviços, mas um pouco mais na indústria, pode chegar a um índice de desemprego em torno de 6 a 7 milhões, o que, no Brasil, representa quase pleno emprego. Em alguns Estados como Mato Grosso do Sul e Santa Catarina, o desemprego já está na ordem de 3%, o que significa escassez de mão de obra. Poderá haver um desequilíbrio com o Norte e Nordeste do país.

A redução dos impostos, especialmente do IPI, PIS e Cofins, assim como do ICMS em produtos energéticos, mostra o efeito Phillips, ou seja, a redução de impostos gera aumento de demanda e consequentemente aumento relativo de arrecadação. Portanto a possibilidade do cenário para o ano de 2023 se apresentar da seguinte forma, não é improvável: PIB 23 = 2,5%; Inflação= 4,5%; Selic= 7,5%; Desemprego= 6,5 milhões; IED= 75 bilhões US$; Superávit Comercial= 50 bi US$; R$/US$ = 5,4.

Reparem, não mencionei uma vez o resultado das eleições presidenciais, pois o racional deste cenário vai além do resultado da definição do novo presidente da República, dos governadores e do Congresso. Poderá, sim, haver variações nos indicadores entre si, mas dificilmente pode se antever um crescimento zero e uma Selic de dois dígitos, pois o BC manterá sua política estável, o Congresso não entrará em aventuras orçamentárias, e vários setores da economia já estão com economia estruturada como o agronegócio, a construção civil, a energia, e vários setores de serviços.

Portanto, é melhor rever seus orçamentos para 2023 para não ser pessimista demais, porque se seu competidor acertar melhor, e com isto ganhar seus clientes e mercado, você lamentará ter perguntado sobre a sua saúde ao coveiro.

Copyright © 2022 Ingo Ploger

https://valor.globo.com/opiniao/coluna/a-economia-que-independe-do-resultado-das-eleicoes.ghtml

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