Quem contamina paga … vale para tudo e todos?

Escrito por Ingo Ploger em .

Article Latin Trade Março 2021

 

 

…quem contamina paga …

vale para tudo e todos?

 

Ingo Plöger

Empresário brasileiro, Presidente CEAL Capitulo brasileiro

 

A França, um dos líderes da União Europeia e do G20, lança o lema

… quem contamina paga…

pensando primeiramente nas emissões de GEE (gases efeito estufa), para a rodada da COP26 em Glasgow. Punir é popularmente eficiente, mas globalmente difícil. A UE entendeu rapidamente que não consegue alcançar seus objetivos de redução dos GEE colocados para 2030, e que sozinha não consegue alcança-los sem incluir a cadeia produtiva global. A cadeia produtiva global precisa necessariamente ser também sustentável, senão a conta não fecha.  A campanha principalmente europeia, contra o desmatamento, que é um dos causadores do GEE, mostra, quão sério é o tema. A punição dos infratores será muito severa, se não cumprirem com as premissas as serem definidas pela Comissão Europeia, haverá restrições de acesso a mercado e sanções econômicas. Atinge em cheio o Mercosul, no acordo recém pactuado entre a EU-MS prestes a ser ratificado pelo parlamento.

A opinião publica acompanha com muita atenção os esforços da América do Sul, especialmente o Brasil, pelo cumprimento do desmatamento zero, como quer a UE. Não são mais os governos que assim o querem, nem as empresas, mas muito mais o consumidor final, que ao consumir produtos, e estes tem quaisquer resquício de desmatamento, mudará de opção.

O sistema financeiro entendeu rapidamente esta preferência, e embora já tenhamos há mais de 15 anos os Princípios de Equador para os financiamentos sustentáveis, traz a cena uma agressiva forma de oferecer financiamentos com fundamentos ESG, cujos parâmetros ainda não estão bem definidos internacionalmente. Pouco importa, aqui o ponto é mostrar rapidamente o comprometimento e sair com um produto de aceitabilidade internacional!

Tudo parece muito lógico, transparente e claro. Se o Mercosul, não mostrar eficácia no combate ao desmatamento, terá restrições mercadológicas, financiamentos seletivos e a sua imagem abalada.

Mas o lema … quem contamina paga… pode ter uma interpretação mais global do que local, e aí as consequências poderiam ser bem diferentes.

Certamente o desmatamento líquido zero (desmatamento bruto legal menos o reflorestamento de nativas) é um objetivo por todos muito bem aceito, ao mesmo tempo combate-se o desmatamento ilegal em todos os níveis.  Para o Mercosul isto significaria um objetivo enorme na redução de emissões. Pelo Código Florestal em implantação, mais possíveis medidas compensatórias e políticas públicas, este objetivo poder-se-ia alcançar em um horizonte de 15 anos.

Boa notícia, com isto estaríamos com o problema resolvido? Certamente que não… e aí estaríamos vendo o real tamanho do problema, em termos globais.

Analisando as Giga tendências, Demografia, Energia e Comunicação, rapidamente chegamos à conclusão que enquanto o cidadão americano consome 87.000kWh/a, o europeu 40.000kWh/a, o latino americano está consumindo apenas 14.000kWh/a. Voltamos a métrica de que se o mundo quisesse ter o estilo americano de vida, necessitaríamos de 5 planetas, e estilo europeu 3 planetas, isto só considerando o consumo de energia e matérias primas, antevendo em 2050 uma população de 10 bilhões de habitantes. A raiz do problema de GEE está nas matrizes energéticas e no estilo de vida dos consumidores. Além disto a matriz energética da América Latina apresenta hoje o melhor índice de renováveis do mundo. 1)

Observando as inovações disruptivas para uma mobilidade elétrica, o consumo de energia elétrica aumentará, e temos aumento exponencial do consumo de informações/dados, hoje dimensionados em Exabites (1 bilhão de Gigabites), que aumenta em segundos… que consome quantidades crescentes de energia, o consumo per capita energético, não tende a diminuir, mas certamente a aumentar. Considerando o lento decréscimo de energia per capita dos países desenvolvidos, e o forte crescimento dos países em desenvolvimento, o consumo de energia per capita mundial continuará a crescer, lembrando que esta energia é predominantemente fóssil e nuclear. Adiciona-se o curioso dado de que a energia elétrica mundial não passa de 15% do consumo total de energia primaria. E os renováveis não passam hoje de 11% da energia primaria (n.b. índice de renováveis na América Latina e de 31%). 2) 3)

Tomo a liberdade de perguntar … quem contamina paga … ainda valerá nestas circunstancias?

A China, que pensa em ciclos milenares, já afirmou que seu propósito de emissões zero foi esticado para o ano de 2050. Bem meus netos que hoje tem 20 anos terão a minha idade para ver se a China conseguiu cumprir o prometido. A UE, já pospõe suas metas com frequência, e a moda agora é colocar as metas longe de qualquer mandato político. Observando os grandes números dos habitantes de alto consumo per capita de energia, estarão dispostos a pagar na proporção de sua contaminação?

Aqui somente fiz referência ao tema da sustentabilidade do nosso Planeta Terra.

Mas estando no meio da segunda onda da pandemia, ouço vozes politicas de referencia global da Europa e dos EUA, que se manifestaram em responsabilizar a China pelas pandemias eclodidas nos últimos anos… se o lema francês realmente for implantado, como ficaria o lema… quem contamina paga…? a abrangência do conceito não necessariamente precisa estar restrito à sustentabilidade, mas teria legitimidade de ser estendida a contaminações globais de saúde, que colocam populações e milhões de pessoas sob risco, além de constranger as economias mundiais. 4)

Como observador atento e crítico das evoluções de giga e megatrends, não me parece suficiente a cruzada da França, que é acompanhada por uma grande maioria de países europeus, de conseguir efetivamente um resultado politicamente eficaz, baseado exclusivamente no princípio da punição. Sabemos das lições históricas que o public hanging no final se vira contra o governante. E a França bem sabe disto. É um processo politico muito arriscado, que não busca sua força maior na solidariedade, na união de forças, por estímulos, pela união em princípios, pela cooperação internacional, mas na qualificação do certo e errado, que pode ter como aqui demonstrado facetas muito distintas.

Reconhecemos também que pós pandemia, teremos uma pobreza bem maior no mundo e uma riqueza acumulada também, o que sugere um pacto diferenciado de cooperação, caso contrario as forças radicais politicas ganharão a cada dia mais força. Não é o que buscamos para consolidar nossas democracias.

Penso que a UE, precisa urgentemente rever a sua postura. O projeto dos primeiros 100 dias de Biden aponta em outra direção, muito mais em cooperação, em olhar na construção conjunta, e de cooperação global, do que na punição, mesmo com adversários.  A América Latina na agenda da sustentabilidade, da democracia, das sociedades livres e abertas é muito mais solução do que problema.  Não que as infrações não sejam punidas, mas não podem ser a base para a cooperação internacional, quando se busca soluções para o Planeta. Só temos um planeta, não temos outro, por isto as iniciativas do One Plant to Live OPL, necessita de soluções inovadoras, e disruptivas, mas solidarias e globais.

“As idéias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões de instituições que atuam.”

Copyright © 2021 Ingo Ploger

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