A Reindustrialização da América Latina …
vamos perder de novo esta chance?
Ingo Plöger
Empresário brasileiro, Presidente CEAL Capitulo brasileiro
Depois de grandes depressões existem retomadas fortes da economia.
2022 indica que teremos crescimento mundial e regional, pós pandemia, acima da média.
As grandes surpresas são de que atualmente as cadeias produtivas globais, se encontram desbalanceadas e mostram a grande fragilidade pelas grandes concentrações regionais, falta de opções flexíveis e desabastecimentos constantes. Os componentes eletrônicos, chips, wavers, mostram a completa falta de previsibilidade e equilibrar a demanda. O setor automotivo ate agora, não se repôs, pela falta destes componentes. Mas a demanda por produtos industriais, também surpreendeu à cadeia produtiva de maquinas e equipamentos, que recebeu pedidos acima do esperado pelas industrias de consumo, farmacêuticas, construção civil, agronegócio, gerando uma demanda muito acima do esperado nos suprimentos. No inicio da pandemia, apagaram-se auto fornos, desativaram-se linhas de produção de processamento de ferro, alumínio, cobre, plásticos, embalagens entre outros. Porem a catástrofe não se sucedeu como prevista, pelo contrário. Houveram demandas bem superiores em vários segmentos.
Este desbalanceamento das cadeias produtivas, levou a indústria global a exercer uma gestão de crise não no lado de vendas, mas no lado de suprimentos. Preços subiram e a escassez de elementos produtivos tornaram-se uma gestão de crise em prioridade e urgência.
No primeiro instante a percepção era de que isto seria passageiro, e após a normalização pós pandemia, o “normal” novamente se instalaria.
Mas na maioria das empresas globais, não é mais este o prognostico. Não foram os maiores ou os mais rápidos, mas os que melhor se adaptaram que se saíram melhor.
Novos investimentos se tiram da gaveta; outros já planejados se tornam realidade. Porem reconhece-se que estes desequilíbrios foram causados por demandas diferentes, fornecedores concentrados em poucos países, retirada de produção precoce e falta de opções de fornecimento. Seremos menos globais e mais digitais, este reconhecimento faz com que se reveja totalmente a cadeia produtiva global, descentralizando os fornecedores de novo e desenvolvendo opções mais criativas, sustentáveis e diversificadas em regiões diferentes.
Tudo na Asia? na Europa, Japão, EUA?
Alguns investimentos estão sendo levados de nova “para casa” mesmo tendo custos mais elevados e menos competitivos; outros buscam novas localizações para incrementar a diversidade e a segurança.
A atenção dos investidores estratégicos de repente se volta novamente para a América Latina. Por todas as mas noticias e a baixa reputação que a Região tem, de repente os resultados não são tão ruins, os indicadores de produtividade e a rápida adaptabilidade mostra a sua resiliência.
As bolsas de valores, IPO´s, greenfields e M&A noticiados mostram esta tendencia.
Países como Peru, Chile, Paraguai, Uruguai são mencionados a despeito de toda insegurança que possa aparecer no noticiário. Mesmo a Argentina é referenciada no Agronegócio e Energia. O Brasil e o Mexico duas locomotivas da Região recebem várias destas investidas. Interessante notar que são as próprias Multi-latinas que encabeçam o coro. No cenário internacional as empresas chinesas continuam com apetite grande, seguidas das americanas e depois as europeias. A atenção está nas cadeias produtivas longas. Importante é diferenciar as noticias dos fatos, maior notoriedade temos daquelas que deixam a América Latina (como o caso da Ford, Walmart entre outras) mas se observarmos os setores, as empresas investidoras nestes setores são muito maiores em volume do que aquelas que se retiram. Os grandes empreendimentos são empresas ancoras no desenvolvimento regional, mas na questão inovação, empregabilidade, sustentabilidade serão as empresas de médio e pequeno porte as que farão a diferença. 1)
É nesta vertente que as politicas de industrialização e retomada do desenvolvimento entram no jogo. Já vimos esta cena em vários filmes do desenvolvimento da América Latina que no final não terminava com um happy end…
Será que iremos perder esta oportunidade de novo?
As nações latino americanas nos últimos 30 anos desindustrializaram seu continente precocemente. Em nome da globalização, e da estabilidade das moedas e da modernidade, os Bancos Centrais deixaram o floating de suas moedas com o viés de valorizarem as mesmas para fazerem frente à inflação, adicionando uma política de juros bem mais elevados que os internacionais. Reformas de relevância eram postergadas por este “conforto”. Esta política estabilizou de fato as moedas, e trouxe à Região um endividamento/PIB abaixo dos países desenvolvidos, e deixando os indicadores econômicos mais favoráveis aos investimentos. Porem perderam pela valorização permanente de suas moedas e juros mais elevados, a competitividade internacional, deixando de beneficiar as suas commodities. A desindustrialização precoce se instalou, aumentando a área de serviços no PIB sem ter uma renda per capita melhor, o que ocorreu na maioria dos países industrializados 2) . A questão social mais exigida pela força democrática, fez com que o Estado tivesse presença maior com serviços piores. Hoje temos uma sub-representação industrial e a agregação de valor é ainda pequena, deixando uma população de quase 450 milhões de habitantes com um per capita muito aquém do possível.
Mas parece que teremos um cenário mais favorável pela frente, pelo desarranjo das cadeias, que oferecem preços maiores aos commodities, e pela desvalorização genérica das moedas da Região a níveis competitivos. Exportar hoje faz sentido, damos ao beneficiamento a competitividade, e com maior emprego na indústria uma melhora significativa de qualidade de vida.
A pergunta que se faz, até quando? Será sustentável?
Os EUA e a Europa, ao saírem da crise, terão juros mais elevados e continuarão a realizar o monetary easing, desvalorizando suas moedas em relação aos outros., o que pressionará a valorização de nossas moedas de novo. Porem as comodities não irá reduzir seus preços tão rapidamente e a tendencia da diversificação de fornecimento beneficiará investimentos na América Latina.
Se não quisermos perder de novo esta chance, as políticas públicas de reindustrialização deverão estar focadas nas cadeias produtivas globais, nas sinergias locais, e na vocação da região. A sustentabilidade veio para ficar e faz parte das vocações regionais, sendo preferência incontestável de consumidores globais. A integração regional tem na logística, energia, serviços e sustentabilidade um enorme potencial de sinergia. A empregabilidade, juntamente com a qualidade de vida está no fomento direto das pequenas e medias empresas, onde novas agendas esperam para serem atendidas, como o cooperativismo (não só nos produtos, mas principalmente nos serviços) e no estimulo à inovação e ao empreendedorismo.
Os Bancos Centrais terão desta vez uma tarefa hercúlea, de aumentar a competitividade do ambiente de oferta de credito, pela competição. Aumentar os juros e valorizar o cambio é veneno para a reindustrialização! Os Bancos Centrais terão a difícil tarefa de equilibrar os créditos emergenciais sociais com a real competição bancaria na oferta para as pequenas e medias empresas. O setor financeiro privado tem fugido desta sua função social durante a pandemia, deixando esta parte mais difícil e importante aos bancos públicos. Os resultados do setor financeiro foram, entre vários setores, o melhor entre muitos. O empossamento de liquidez se mostra nos balanços, e dentro do emergencial, os Bancos Centrais, estavam mais preocupados em manter a liquidez e a inflação sob controle. Agora é dar suporte ao ambiente positivo de investimentos e dar competitividade para créditos de curto e longo prazo. As novas tecnologias das fintec´s ajudam nesta tendencia, de viabilizar a intermediação de serviços financeiros a preços bem competitivos. Mas aos Bancos Centrais será dado uma missão de maior relevância para a reindustrialização. A reindustrialização porem terá características novas, pela maior inovação, digitalização e inserção nas cadeias produtivas incluindo as pequenas e medias empresas nas melhores práticas de sustentabilidade.
A “nova indústria” na América Latina, será digitalizada, de alta competência internacional, flexível, sustentável e se adaptando no novo modelo de governança.
Será que sou o único que estou vendo isto?
Se assim não for quem ainda devemos convencer disto?
1) J. Arbache – Política Industrial https://valor.globo.com/opiniao/coluna/a-politica-industrial-do-seculo-xxi-1.ghtml
2) R. Ricupero Desindustrialização precoce https://diplomatique.org.br/desindustrializacao-precoce-futuro-ou-presente-do-brasil/